segunda-feira, 21 de março de 2011
Nem um sismo e um maremoto os abate
«Aqui há uns 30 anos, um conhecido meu que tinha uma loja de modelismo em Lisboa, viajou até ao Japão para contactar os fornecedores de modelos de aviões.
Convidado para um passeio por um deles, foi levado a um jardim onde havia um santuário dedicado à memória dos pilotos kamikaze da II Guerra Mundial. Tocado pela singeleza e beleza do lugar, o meu conhecido, espontaneamente, fez uma pequena homenagem aos mortos ali recordados: uma vénia e algumas pétalas de flores espalhadas em redor. Os anfitriões não fizeram o menor comentário a esta atitude e o passeio continuou, seguido de jantar. Na manhã seguinte, dia da partida para Portugal, o meu amigo tinha à saída do hotel, um grupo de crianças de uma escola de Tóquio agitando bandeiras portuguesas, numa alegre e ordenada "guarda de honra".
Esta tão única maneira de ser dos japoneses, milenarmente apurada pela cultura, pela educação e pela organização social, expressou-se mais uma vez quando do cataclismo que atingiu o país há uma semana. A reserva emocional, a contenção e o estoicismo colectivo de que os nipónicos estão a dar provas face a um desastre destas dimensões têm ficado patentes nas imagens das televisões. Contam-se pelos dedos de uma mão os acessos de choro, as perdas de controlo, as berrarias descompassadas ao gosto latino. A exibição escancarada da dor não tem nada a ver com os japoneses.
Perante isto, e o trabalho das equipas de socorro, ficamos com a convicção de que o Japão estará recuperado e a caminho da normalidade nalguns meses. Alguns povos agigantam-se nas catástrofes, enquanto que outros deixam-se esmagar por elas.»
Eurico de Barros
in Diário de Notícias, 19 Março 2011.
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