quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Contradições europeias

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A ideia da união dos povos da Europa numa confederação ou federação de Estados, como transição para um superestado único, teve muitos e diferentes progenitores: desde o escritor fascista francês Drieu de la Rochelle aos democratas-cristãos Schuman e Monnet.

Estes porque, traumatizados por duas guerras fratricidas entre europeus e no meio da Europa (e só resolvidas pela chegada dos americanos), pensaram que acabar com as nações e as fronteiras era a solução ideal para acabar com a guerra.

Os fascistas europeístas viam na Europa o Império que se podia opor ao império oriental dos bolcheviques e ao império ocidental do capitalismo americano. Além de ser uma forma universalista de superar os nacionalismos e evitar o seu choque mortal.

DEPOIS de 1945, os países europeus já não eram os poderes da terra: a Alemanha fora vencida e estava destruída; a Itália também ficara do lado dos vencidos; a França, teoricamente entre os vencedores, fora vencida pela vencida Alemanha e libertada, outra vez, pelos americanos. A Grã-Bretanha era a única potência europeia que aguentara toda a guerra e não fora ocupada. Mas, como tinham percebido Chamberlain e os apaziguadores de 1938, o custo da guerra mundial era a perda do Império e a subordinação aos Estados Unidos.

Não era difícil entre as pedras deste mosaico de poderes diminuídos evitar o conflito. Qual seria o objectivo desse conflito, relegados para poderes de segunda classe, com os impérios em liquidação, as cidades e as indústrias destruídas?

A partir daí a ideia da União como forma de restabelecer a força, fazia sentido. Primeiro a união económica – o mercado comum; depois a financeira. Mas quando se chegou à união política e foi preciso consultar os povos, estes disseram – os franceses e os holandeses – que não. Abdicar da soberania nacional não era o mesmo que fazer trocas comerciais e circular livremente.

A experiência da moeda única foi outro caminho sinuoso para a unidade política. Esta sempre fora apresentada, pelos seus defensores, como uma unidade entre iguais. Mas os Estados não são iguais, são muito diferentes nos factores do poder. Como não se teve em conta os factores históricos e culturais, o motor foi uma vontade político-tecnocrática que se quis fundamentar nas razões da economia e impor através do direito.

A REALIDADE chegou com a crise das dívidas soberanas que mais não é que uma projecção da crise económica europeia. A Europa não tem recursos naturais nem manufacturas comercializáveis que possam permitir o nível de vida a que os governos habituaram os povos. A solução foi a dívida, encorajada por esses governos que são uma espécie de dirigentes clubísticos que procuraram agradar aos membros da agremiação dando-lhes crescentes regalias e benesses.

Não havendo recursos naturais – nem de energia, nem de comida – e tendo, com excepção da Alemanha e de uns poucos e pequenos países do Norte e Centro, desmantelado a indústria, que passou para a Ásia, o recurso para manter esta economia de serviços com os seus habitantes contentes foi recorrer ao crédito. Ir pedindo emprestado hoje para pagar amanhã.

Criou-se assim um socratiano universo de ‘gestão’ indolor dos passivos, nos países do sul. Quando a crise de 2008 abriu asas sobre a Europa e a zona euro, percebeu-se a extensão da dívida e os prestadores começaram a exigir condições usurárias.

Na alternativa da sobrevivência a União Europeia começou a devorar as suas próprias instituições para sobreviver: os governos eleitos, bons ou maus, mas eleitos, foram substituídos na Grécia e na Itália, por governos chefiados por tecnocratas europeístas. E o directório germano-francês, personalizado por Merkel e Sarkozy, passou a decidir (ou não decidir) tudo, marginalizando os países pequenos e a própria Comissão.

Ou seja, em nome da eficácia, neutraliza-se a democracia.

Jaime Nogueira Pinto
in "Sol", de 6 de Janeiro de 2012.

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