sábado, 31 de agosto de 2013
Novembro
Novembro
Jaime Nogueira Pinto
A Esfera dos Livros
512 Páginas
O que faz correr Eduardo Pinto de Vasconcellos para a sede semi-clandestina de uma organização nacionalista nas vésperas de exames decisivos? E que sombras carrega o pai, Henrique, ex-voluntário na Guerra de Espanha e banqueiro internacional? O que move Alexandre, intelectual, romântico, tímido e revolucionário?
No Verão de 1973, a História está a preparar-se para tomar conta das histórias destes homens e das mulheres que amam levando-os por Lisboa, Madrid e Luanda na torrente da conspiração, da revolução e da contra-revolução, até ao Inverno de 1975.
Os heróis de Novembro agem, lutam e amam sabendo, à partida, que a sua empresa é necessária mas em grande parte fútil. Vivem a história de uma outra geração de 68, que também tinha 20 anos no 25 de Abril. Novembro não é um livro de História, é um romance que se lê como um romance, um xadrez de personagens, lugares, paixões, segredos, intrigas. E também a memória de um Portugal desaparecido. Em Novembro tudo acaba: O Império, a Revolução e os sonhos dos que, dos dois lados, não ficaram no meio e deram tudo por tudo.
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sexta-feira, 30 de agosto de 2013
quinta-feira, 29 de agosto de 2013
"A finalidade da linguagem é desencadear uma acção"
"No início, falar era uma acção difícil; é lógico presumir, portanto, que apenas se utilizasse a fala quando estritamente necessário. Ainda nos nossos dias o camponês, comparado ao habitante das cidades, pode considerar-se um ser taciturno, enquanto que o citadino, tão habituado está a falar, que continuará a fazê-lo mesmo sem nada para dizer, por mera tagarelice e por pura ociosidade. A finalidade primeira da linguagem é desencadear uma acção, em conformidade com uma intenção e com o tempo, o lugar e os meios disponíveis. Que a frase tenha, então, uma estrutura clara e sem ambiguidades, é algo de necessidade primordial. A dificuldade de alguém se fazer compreender e impor a sua vontade a outrém está na origem de muitas técnicas gramaticais e sintácticas, técnicas que fornecem o modo adequado de mandar, perguntar, responder e, finalmente, técnicas de formação das palavras gerias; e todo este conjunto não se baseou nas intenções ou desígnios teóricos, mas pragmáticos. O papel desempenhado pelo pensamento teórico, nos primórdios da linguagem, durante a formação da linguagem brotava das necessidades práticas, como derivante do «pensamento manual»."
Oswald Spengler
in "O Homem e a Técnica", Guimarães & C.ª Editores.
quarta-feira, 28 de agosto de 2013
"Um ministério é um grupo casual de indivíduos, que intrigaram para estar ali"
"O parlamento é uma casa mal alumiada, onde se vai, à uma hora, conversar, escrever cartas particulares, intrigar um pouco, e combinar partidas de whist. O parlamento é uma sucursal do Grémio. A tribuna é uma prateleira de copos de água intactos.
O ministério, o poder executivo, deixou de ser um poder do Estado, é uma necessidade do programa constitucional: está no cartaz, é necessário que apareça na cena. Não governa, não tem ideia, não tem sistema; nada reforma, nada estabelece; está ali, é o que basta. O país verifica todos os dias que alguns correios andam atrás de algumas carruagens — e fica contente.
— Lá vai um ministro! diz-se na rua.
— Ah! vai? — exclama a burguesia. — Bem, existe a ordem.
Um ministério é um grupo casual de indivíduos, que intrigaram para estar ali."
Eça de Queiroz
in "As Farpas", Maio de 1871.
terça-feira, 27 de agosto de 2013
A acção do escol
«A acção do escol abrange uma tripla tarefa, totalmente inspirada na convicção de que as multidões, sendo facilmente conduzidas, são incapazes de criar. Inicialmente, as ideias novas devem ser impulsionadas pelos espíritos fortes: só eles podem provocar a fractura dos hábitos e dos interesses, e só eles podem desempenhar o duro trabalho de pioneiros. Esta é a sua primeira missão. Mas, a todo o momento, as massas carecem de exemplos, porque, embora perfectíveis, só exemplarmente podem ser aperfeiçoadas. As ideias, como a religião, necessitam de vidas exemplares, que as personifiquem. E esta é a segunda missão dos homens que representam as ideias. Finalmente, um Poder forte, justamente porque é forte, exige sempre a comparticipação de agentes seguros, fiéis, desinteressados, que lhe indiquem erros, omissões, estados de ignorância, e, em compensação, deve fazer compreender os seus objectivos e decisões. Esta é a missão propriamente política do escol, exercício de fiscalização e de ensino.
As três funções correspondem aos três princípios do Poder, distintos na célebre teoria de Montesquieu, mas, na verdade, reunidos em todos os Estados completos e sadios. À primeira tarefa equivale o temor, pois nenhum Estado pode prescindir da disciplina; à segunda corresponde a honra, porque não pode existir Estado sem ideal; à terceira equivale a virtude, pois nenhum Estado pode subsistir sem desinteresse. E estes princípios correspondem, também, aos três preceitos capitais da acção, que são as virtudes do padre, do militante e do soldado: a coragem na confissão da fé, o sacrifício na experiência diária e o amor na vocação que se escolheu.»
Maurice Bardèche
segunda-feira, 26 de agosto de 2013
Deslocalização = Destruição
"A informatização das empresas americanas promoveu a hemorragia de postos de trabalho e de sectores inteiros de actividade que se mudaram para lugares remotos, bem como a «deslocalização» de departamentos inteiros para outros países. Os rendimentos decrescentes adicionais associados à vitória retalhista nacional foram a destruição maciça das comunidades americanas, incluindo o hardware das localidades e o software dos papéis sociais e redes a elas associados. Os computadores limitaram-se a ajudar as empresas predadoras a parasitarem mais eficazmente os valores existentes nas localidades vitimizadas. Foram extremamente bem-sucedidos na tarefa de sugar a alma de comunidades complexas. Ajudaram a «converter» a complexidade em simplicidade (um enorme estabelecimento em lugar de vinte e sete pequenas empresas locais) e a aumentar a entropia da sociedade."
James Howard Kunstler
in "O Fim do Petróleo - O Grande Desafio do Século XXI", Bizâncio, 2006.
domingo, 25 de agosto de 2013
sábado, 24 de agosto de 2013
Homo consumens
"Não deixa de ser inacreditável, em plena crise e em período de férias, continuarmos a ver as grandes superfícies comerciais cheias de pessoas que insistem em comprar uma miríade de objectos inúteis. Bombardeados pela publicidade, correm prontamente às “novidades” que em nada são essenciais à sobrevivência.
Recorde-se uma passagem do excepcional “Clube de Combate”, de Chuck Palahniuk: “Compras mobília. Dizes a ti próprio, este é o último sofá de que vou precisar para o resto da minha vida. Compras o sofá e depois, durante um par de anos, sentes-te satisfeito porque, aconteça o que acontecer de errado, pelo menos, conseguiste resolver a problemática do sofá. Depois é o serviço de pratos certo. Depois a cama perfeita. Os cortinados. A carpete. Depois ficas encurralado dentro do teu lindo ninho e as coisas que dantes possuías, agora possuem-te a ti.”
Possuídos pelas coisas, tornamo-nos dependentes. Como escreveu Guillaume Faye, em “L'Archéofuturisme”, “o sistema torna dependente a sociedade civil com recompensas, vantagens, falsos privilégios, prémios inúteis”. Mas essas vantagens são falsas e este pensador contemporâneo francês exemplifica: “Faz-se crer a uma pessoa que é livre, mas na verdade está enjaulada, que conduz rapidamente o seu carro GTI, ainda que este a arruíne todos os meses, e que no final perde tanto tempo nos engarrafamentos como as horas de trabalho necessárias para pagá-lo.” E para quê? Faye explica que é “para fazer esquecer o desemprego, o trabalho precário, a insegurança, os alimentos adulterados, a degradação do Ambiente, ou o lento desaparecimento do seu Povo”.
Deixamos de ser cidadãos de um país para nos tornarmos consumidores do mundo. É esse o objectivo último da mundialização. É exactamente essa massificação que devemos combater, começando por nós próprios, no seio da nossa comunidade nacional."
Duarte Branquinho
in «O Diabo», 13 de Agosto de 2013.
O Cônsul Aristides Sousa Mendes - A Verdade e a Mentira
O Cônsul Aristides Sousa Mendes - A Verdade e a Mentira
Carlos Fernandes
Edição de autor
326 Páginas
O embaixador Carlos Fernandes, diplomata de carreira e professor universitário, com vasta obra publicada, foi sempre um moderado, na sua vida privada e na pública. E é-o neste livro. Nunca quis entrar na política, mais ou menos partidária, para que foi convidado desde muito novo. Só quis servir o Estado, isto é, toda a comunidade portuguesa organizada como tal, e não apenas uma fracção dela. E serviu-o durante muitos anos e intensamente, como se verifica pelo seu extraordinariamente vasto curriculum vitae, tendo tido actividade notável na negociação dos acordos no seio da EFTA, na Conferência da Haia de Direito Internacional Privado, e sido até pioneiro na elaboração e negociação dos acordos sobre protecção no trabalho e segurança social dos emigrantes, e na transferência de presos condenados e a cumprir prisão no estrangeiro.
Cansado de ler e ouvir tão abundantes como mirabolantes fantasias a respeito de A. de Sousa Mendes, enquanto cônsul de Portugal em Bordéus, em Junho de 1940, fantasias que este nunca invocou nem sugeriu, além de pressionado por vários amigos, dado que ele é, actualmente, a única pessoa viva que, ainda no MNE, conviveu com Sousa Mendes, e, crê-se, a única dos que sobre ele escreveram que o conheceu pessoalmente, decidiu escrever este livro, repondo a verdade sempre que o julgou necessário, sem deixar de evidenciar simpatia pessoal, não profissional, por este cônsul de Portugal, dadas as circunstâncias de tempo, lugar, e psicológicas em que actuou.
É, como verificarão, um livro muito bem documentado, e, sem dúvida, a queda de um mito, não de um anjo, já que esta descreveu-a o grande Camilo Castelo Branco de forma inexcedível.
O leitor vai encontrar aqui vasta informação relevante que certamente desconhecia, porque, propositadamente, se tem omitido ou deturpado, por razões políticas e económicas, que aborrecem a verdade.
Aristides, ao contrário do que se tem propalado, não deu 30.000 vistos dos quais 10.000 a judeus nos dias da ira, mas apenas entre 600 e 650, nunca tendo sido exonerado de cônsul de Portugal nem aposentado por Sal azar, recebendo até morrer o seu vencimento como tal.
Desde alguns descendentes de Aristides até ao influente político americano de origem açoriana Tony Coelho, passando por grupos judaicos amestrados para isso, e por Jaime Gama e outros políticos portugueses, tem-se elevado uma monstruosa montanha mitificadora à base de falácias que não engrandecem quer Aristides quer a Assembleia da República, quer o Governo e o Presidente da República que para isso contribuíram.
Encomendar através de: Livraria Apolo 70, Livraria Almedina, Bulhosa.
sexta-feira, 23 de agosto de 2013
“Jurámos que nunca nos tornaríamos conformistas”
"Jean Mabire não fabricou um sistema, fez viver um sonho. Abriu uma via e deixou um modelo: o de um homem que viveu sempre de acordo com as suas ideias. Os seus talentos ter-lhe-iam permitido uma grande carreira na imprensa e na edição do seu tempo desde que se negasse. Tal era para ele impensável e impraticável. Escolheu continuar fiel aos reprovados entre os quais se sentia bem. Em “Drieu parmi nous” (1963), escreveu: “Jurámos que nunca nos tornaríamos conformistas”. É o que assegurará a sua perenidade."
Dominique Venner
quinta-feira, 22 de agosto de 2013
Eliade e Schmitt em Lisboa
"24 de Maio de 1944
Passei os últimos dias com Carl Schmitt, convidado a vir a Portugal para algumas conferências. Domingo de manhã, fui com ele ao Museu das Janelas Verdes, onde ficámos mais de uma hora em frente à Tentação de Santo Antão de Bosch. Conta-me que a interpretação de Bosch é a última moda na Alemanha, que todo o mundo trata dele, embora poucos publiquem. Os bombardeamentos e a insegurança ajudam os Alemães a entenderem e a reencontrarem-se em Bosch; que não é tão «fantástico» como se possa acreditar, mas está cheio de pormenores biográficos e de história contemporânea (por exemplo, Schmitt fala-me das sociedades secretas que tinham a protecção do imperador e que executavam os magistrados corruptos depois de um julgamento prévio e uma condenação à morte segundo todos os cânones jurídicos: na Tentação de Santo Antão, em baixo, à esquerda, o pássaro — símbolo da justiça, traz no bico um envelope fechado, provavelmente uma condenação à morte). O seu amigo, Wilhelm Fraenger, trabalha há dez anos na leitura de Bosch, e escreveu uma gigantesca monografia de mais de mil páginas sobre ele, ainda não publicada.
Comi várias vezes com Schmitt. Acho que sou a pessoa que mais o viu em Lisboa. Diz-me que lamenta não ter encontrado Blaga em Bucareste e tem a certeza de que na concepção do espaço de Blaga há coisas interessantes.
Comentámos juntos Land und Meer. Para o livro em que trabalha, sobre o nómos do mundo, ofereço-lhe alguns paralelos histórico-etnográficos.
Conta-me que está optimista quanto ao destino da Europa. O nacionalismo e o internacionalismo são fórmulas ultrapassadas."
Mircea Eliade
in "Diário Português", Guerra e Paz, 2007.
quarta-feira, 21 de agosto de 2013
Depois do Império: percepções paralelas
"Churchill and Empire: Portrait of an Imperialist (ed. Weidenfeld & Nicolson, Londres) é o mais recente livro de Lawrence James, um historiador reputado do Império Britânico.
Nele se recordam as origens, apogeu e queda do estadista da resistência e da vitória da II Guerra e se revelam algumas das suas percepções e sentimentos (talvez surpreendentes para os admiradores) em relação aos povos e às raças não brancas. Chineses, árabes, indianos, africanos, recebem epítetos sarcásticos e às vezes insultuosos. A cosmovisão de Churchill é clara e assumidamente baseada na convicção da superioridade da raça branca, sobretudo dos anglo-saxónicos, germânicos e nórdicos.
É certo que não devemos julgar os homens e as instituições do passado pelos valores dominantes hoje, sob pena de acabarmos numa homília moralizadora, panfletária e tola — ao modo de alguns esquerdistas frenéticos e aplicados. Churchill tinha a visão racista e supremacista da época tardo-vitoriana: o homem branco levava o fardo do mundo, tinha o dever de conduzir os outros povos para o progresso e para a civilização, e pelo caminho de ir enquadrando, explorando e corrigindo os demais — pelos mais variados meios, que podiam incluir o chicote e o trabalho forçado…
Estou a escrever estas linhas e a pensar na visita que fiz, no domingo passado, 28 de Julho, guiado por um amigo angolano, herói do seu país, ao Museu Nacional de História Militar de Angola, na Fortaleza de S. Miguel de Luanda. O que ali está pode ser um bom exemplo e modelo para as relações entre povos que no passado tiveram uma relação de domínio. Ali, as estátuas dos navegadores e soldados portugueses — Diogo Cão, Salvador Correia de Sá e o colonial Henrique de Carvalho — repousam, juntas, à sombra discreta das árvores e, ao fundo, podem também ver-se as de D. Afonso Henriques, Camões e Vasco da Gama.
Depois há a galeria dos azulejos, belíssimos e muito bem restaurados, com os temas e os motivos da História político-militar e da fauna e natureza de Angola. Estes são únicos em inspiração, simbolismo e estética — os animais e plantas de Angola, os quadros da História Política, as paisagens da selva, dos rios e das cidades.
Nas salas da história contemporânea é dominante o papel dos líderes do movimento independentista, vencedor da guerra civil; mas não há ressentimento nem humilhação nem para os colonizadores nem para os movimentos rivais.
Sob o sol de um domingo de cacimbo, eu e os meus companheiros de viagem não nos sentimos excluídos nem agredidos pela história ali contada. Talvez por que, apesar de tudo o que é o peso das heranças imperiais – em que a glória de uns é a derrota e a humilhação de outros – fomos diferentes e procurámos perceber, unir, integrar. Parece que eles, os angolanos, estão a fazer o mesmo. O que é bom e está certo."
Jaime Nogueira Pinto
in "Sol", 2 de Agosto de 2013.
terça-feira, 20 de agosto de 2013
segunda-feira, 19 de agosto de 2013
sexta-feira, 16 de agosto de 2013
Corpos colossais e cabeças pequeninas
"Lembram-se daqueles filmes, telefilmes e séries de televisão em que um pai e um filho vão acampar/caçar/pescar para um sítio remoto, o pai sofre um acidente que o deixa imobilizado e o filho tem de vencer os seus medos e transpor vários obstáculos naturais para ir pedir ajuda? Pois é exactamente essa a história de Depois da Terra, reciclada para um futuro distante de mil e tal anos, e disfarçada e enfeitada a efeitos especiais digitais. O cinema de ficção científica (FC) — leia-se: produzido em Hollywood — insiste em frustrar e desesperar os apreciadores da literatura do género, e agora cada vez mais, desde que os computadores parecem ter tomado o controlo das operações. Filmes como o recente Esquecido, de Joseph Kosinski, com Tom Cruise, ou Batalha do Pacífico, de Guillermo del Toro (estreia-se para a semana), parecem mais produtos de um software do que de argumentistas de carne e osso. A originalidade das histórias, a elaboração das personagens e a credibilidade científica diminuem na razão inversa do aumento da importância, da complexidade e da omnipresença dos efeitos especiais. Os filmes de FC são, cada vez mais, bisarmas microcéfalas, com corpos colossais e de aspecto sofisticadíssimo, mas cabeças pequeninas e cérebros atrofiados, apostados em proporcionar aos espectadores apenas uma experiência visual e sonora que nalguns casos se resume a agressão óptica e auditiva em jacto contínuo. Não é o caso de Depois da Terra, que faz figura de bastante contido nesses departamentos, embora o filme de M. Night Shyamalan seja, de novo, um desperdício de paisagens cósmicas, cenários pós-apocalípticos (no caso, uma Terra vazia de humanos e devolvida à fauna e à flora) e tecnologia avançada (já agora: como é que uma civilização capaz de terraformar um planeta e construir naves que saltam pelo cosmos, entre outros avanços, equipa uma tropa de elite com lanças de lâminas duplas, em vez de armas mais consentâneas com o seu desenvolvimento técnico?). Em suma, o melhor filme de FC dos últimos tempos continua a ser o modesto Moon — O Outro Lado da Lua, de Duncan Jones (2009). Feito em Inglaterra por tuta e meia."
Eurico de Barros
in "Diário de Notícias", 11 de Julho de 2013.
segunda-feira, 12 de agosto de 2013
terça-feira, 6 de agosto de 2013
O Caminho da Floresta
"Os homens sem importância, tal como os homens excepcionais, também sofrem grandes derrotas. E depois de uma derrota, o exílio parece uma espécie de solução. Pode ser o exílio que resulta da expulsão, do ostracismo, ou o exílio enquanto fuga, isolamento. É o caminho da ilha e o caminho da floresta. Já escrevi sobre a ilha. Falemos agora da floresta.
Em 1951, o escritor alemão Ernst Jünger publicou um dos seus textos mais importantes: “Der Waldgang”, que na tradução portuguesa [de Maria Filomena Molder, Cotovia] se chama “O Passo da Floresta”, e que noutras línguas tem títulos como “o recurso às florestas” ou “a retirada para a floresta”. É um ensaio poderoso, escrito num estilo hermético e vago, não uma divagação, diz Jünger, mas um “um excurso grave”. O tema é a catástrofe e a resposta à catástrofe. A proposta é a figura do “desterrado” como uma figura da resistência.
O texto tem um contexto histórico (o pós-guerra) e um contexto político (a derrota alemã) precisos, e faz bastantes considerações ideológicas que não acompanho. Mas o tom deliberadamente abstracto permite que tomemos “O Passo da Floresta” como um manual de resistência, ainda que não com a intencionalidade específica com que foi escrito. Não é por acaso que a tradução francesa tem como título alternativo “Tratado do Rebelde”. O texto vale para outras circunstâncias que não a alemã de 1951 porque a rebeldia não depende de um momento nem de uma situação.
O desterrado é uma figura por excelência do mundo contemporâneo, o homem que sobreviveu à catástrofe e se refugiou na floresta. Não procura um idílio contemplativo, meramente espiritual, mas um caminho, ou seja, uma escolha vital. “O lugar da liberdade”, escreve Jünger, “é completamente diferente da mera oposição, diferente também daquele que a fuga lhe pode oferecer. Chamamos-lhe a floresta. Nesse lugar há recursos diferentes.”
A floresta tem conotações mitológicas em todas as religiões, e remete também para exemplos concretos de guarida de rebeldes, mas aqui não é questão de uma floresta propriamente dita: a floresta está em todo o lado, inclusive no meio de uma grande cidade. Não é um local mas um espaço mental. Um espaço que se opõe à ideia de ‘barco’ ou de ‘navegação’. Os vencedores querem levar os vencidos para alto mar, em direcção ao esquecimento ou ao naufrágio. Mas cabe ao indivíduo recusar essa servidão. E recusar também o quietismo niilista que é a única alternativa que lhe oferecem.
O desterrado escapa ao desterro no sentido jurídico, não é um proscrito mas um homem que voluntariamente toma o destino nas suas mãos. Um homem derrotado, acossado, humilhado, mas que recusa o medo e o fatalismo e se compromete com a sua liberdade, visto que “uma história autêntica só pode ser feita por homens livres”. O desterrado foge à prisão, mas também foge ao seu tempo. Decide não ser desconfiado, intriguista, filisteu, interesseiro, manobrável, faz uma escolha existencial da qual não há regresso.
O caminho da floresta é um percurso solitário: “Entre as marcas características da interrogação, a solidão é uma delas. Ela é particularmente notável em épocas nas quais o culto da sociedade floresce. Mas que precisamente o colectivo apareça como o não-humano, essa é uma das experiências a que poucos são poupados”. O desterrado, diz Jünger, prefere a identidade à comunidade, porque a comunidade está pervertida.
É um caminho difícil, a floresta, um abrigo mas também um perigo. Daí que “O Passo da Floresta” valorize tanto os escritos pessoais e autobiográficos, os textos de profundis. Eles são a forma de comunicação por excelência do desterrado, porque o desterrado vive na floresta e a floresta, que está em todo o lado, vive sobretudo na linguagem.
O caminho da ilha, ou da “navegação”, como lhe chama Jünger, é a imposição de um castigo e, mais ainda, de uma temporalidade degradada, do ar rarefeito que se segue à catástrofe, da atmosfera venenosa do niilismo. O caminho da floresta é o oposto disso, é uma acção livre e independente, em que o indivíduo abandona a submissão, a indiferença, a neutralidade, o abaixamento pessoal, e desaparece, decide-se pelo underground, vai pelo trilho da floresta, que é secreto e aventuroso.
Se até de um Imperador fizeram um desgraçado, como aconteceu com Napoleão em Santa Helena, o que farão os vencedores de nós, que somos gente comum e pequena? Precisei de conhecer a catástrofe, e o seu gémeo em tempos de paz, que é o niilismo, para compreender este texto de Jünger. Não é apenas um exercício espiritual, é um manual de rebeldia. Uma rebeldia que pode ser tão invisível como a catástrofe foi invisível, nem todos os fracassos são espectáculo para o mundo, e nem todas as recusas são um número de circo. O desterrado é uma figura que entendo, que aceito, que me convém, a figura da retirada soberana, de um refúgio que cada um tem em si mesmo, não desligado dos outros mas hostil ao ‘colectivo’, à comunidade dos vencidos que se crêem vencedores, à gente que está em festa para esconder que não acredita em nada.
Queriam-nos, queriam-me, derrotados e expostos ao gozo da multidão. Mas não nos apanham. Já demos, já dei, o passo adentro da floresta."
Pedro Mexia
in Expresso, 30 de Julho de 2011.
domingo, 4 de agosto de 2013
sexta-feira, 2 de agosto de 2013
Pena e Espada
"Actualmente, vê-se um intelectual como alguém avesso ao exercício físico, afastado do comum dos mortais, imerso nos seus pensamentos e superior aos demais. Por fim, há a ideia generalizada de que se trata de alguém que recusa o envolvimento directo, a violência da acção e, em último caso, a guerra.
Regressemos aos clássicos. Na Grécia Antiga, a filosofia e o saber não estavam desligados do treino físico e militar. A maioria dos intelectuais gregos desse tempo tinha experiência de guerra. Sócrates foi hoplita e participou em pleno menos três batalhas. Ésquilo combateu em Maratona contra os persas. Sófocles foi comandante das forças atenienses na conquista da ilha de Samos, durante a Guerra do Peloponeso. Para além de filósofos, não esqueçamos historiadores como Tucídides ou Xenofonte. Já em Roma, onde muitos outros nomes podiam ser apontados, como o de César, recorde-se o famoso ‘mens sana in corpore sano’, retirado das “Sátiras” de Juvenal. A lista seria infindável, mas não se resume às civilizações clássicas.
De Cervantes, que combateu na Batalha de Lepanto, a D’Annunzio, que marchou sobre Fiume, a História da Europa está repleta de grandes intelectuais que não se negaram ao combate, que não se intimidaram perante as “Tempestades de Aço” que contou e viveu Jünger. Homens que, como o nosso Camões, levavam “numa mão a espada, noutra a pena”.
Da última vez que Portugal chamou, “vestiram-se os poetas de soldados”, como escreveu Rodrigo Emílio. Assim deve ser.
A cómoda atitude daqueles que se refugiam nas nuvens, afastados da sua terra e do seu povo, que não sentem a comunidade e não estão prontos a defendê-la, é pura cobardia, normalmente mal disfarçada de pacifismo.
O pensamento não pode ser algo estéril. Como afirmou Ezra Pound: “a única cultura que reconheço é aquela que se torna acção”."
Duarte Branquinho
in «O Diabo», 2 de Julho de 2013.
quinta-feira, 1 de agosto de 2013
"Lancemos um olhar a toda a volta"
"No curso dos tempos, a liberdade não ocupa muito mais instantes do que o êxtase na vida de um místico. Escapa-nos no próprio momento em que tentamos agarrá-la e formulá-la: ninguém pode fruí-la sem temer. Desesperadamente mortal, ela postula, a partir do momento em que se instaura a sua falta de futuro e trabalha, com todas as suas forças minadas, para a sua própria negação e para a sua própria agonia. Não entrará uma certa dose de perversão do nosso amor por ela? E não será aterrador dedicarmos um culto ao que não quer nem pode durar? Para vocês que já não a têm, é tudo; para nós que a possuímos, não passa de ilusão, porque sabemos que a perderemos, e porque, seja como for, ela é feita para ser perdida. Por isso, no meio do nosso nada, lancemos um olhar a toda a volta, sem descurarmos ao fazê-lo as possibilidades de salvação que em nós próprios residem."
E. M. Cioran
in "História e Utopia", Betrand Editora.
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