segunda-feira, 29 de julho de 2013
Eliade e Schmitt
"1942, Berlim
Goruneanu [membro da Legação] leva-me hoje a Carl Schmitt, que desejava há muito saber o que é a filosofia de Nae Ionescu. Uma casa em Dahlem, com mobília muito pouco alemã, alguns quadros modernos e uma biblioteca rica em livros antigos. Carl Schmitt é baixo, uma figura pouco impressionante, mas luminosa, cheia de vida. Fala fluentemente francês. Digo-lhe que da obra dele conheço apenas Die romantische Politik, que tanto influenciou Nae Ionescu, Țuțea e os outros. Mas, em vez de começarmos a falar de Nae Ionescu, pergunta-me de Salazar, de Portugal, das culturas marítimas — e falamos durante três horas. Ele está a escrever um livro sobre «terra e mar», e leu imenso sobre a arte, a cultura e o simbolismo aquático. Diz-me que Moby Dick é a maior criação do espírito marítimo, a seguir à Odisseia. Mostra-me alguns quadros estranhos de um pintor alemão moderno, cujo nome depressa esqueço; visões submarinas, cosmológicas.
Como eu próprio estudo, há tantos anos (A Mandrágora), tais questões, deixo-me enfronhar em interpretações de símbolos e mitos austro-asiáticos, que a ele o interessam. Prometo enviar-lhe Zalmoxis II, onde publiquei Notes sur le symbolisme aquatique. O que me impressiona em Schmitt é a sua coragem metafísica, o seu inconformismo, a vastidão da sua visão. Faz-me lembrare Nae. Oferece-nos uma garrafa de vinho do Reno. Está encantado por me conhecer e lamenta que parta amanhã para Madrid. Diz-me que o homem mais interessante, hoje em dia, é René Guénon. Leva-nos até à estação de metro, falando-me da aviação como símbolo «terrestre»."
Mircea Eliade
in "Diário Português", Guerra e Paz, 2007.
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