quinta-feira, 2 de junho de 2011

Herculano e o regresso à terra

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"Herculano desempenhou igualmente um importante papel nos acontecimentos em curso, mas a dada altura, inesperadamente, retirou-se da vida política, abandonou por completo as preocupações literárias, interrompeu a redacção da grande História de Portugal que tinha iniciado, para se esconder numa quinta, solitário, sem nunca mais tocar numa caneta, dedicando-se exclusivamente à agricultura, durante dez anos, até à data da sua morte. É impressionante e sugestivo este regresso total de Herculano à terra. Podia-se nele desvendar, não apenas o desgosto de uma pessoa honesta para com a detestável vida pública, mas também o melancólico despertar do paraíso artificial das suas teorias políticas. Talvez Herculano tenha percebido que a história de Portugal, como qualquer história de uma nação viva a criadora, é bem diferente do conflito entre abstracções, que a vida e a grandeza das nações têm as suas raízes noutro lugar que não o "Contrato Social" e a moral kantiana. É, em todo o caso, um exemplo rico em significados ocultos a clausura desse grande historiador e político numa quinta onde irá passar o resto da sua vida, dedicando-se às coisas vivas e férteis, esforçando-se por reencontrar-se e reintegrar-se na antiga comunidade portuguesa."

Mircea Eliade
in "Salazar e a Revolução em Portugal", Esfera do Caos.

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